quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Venda de máquinas está em colapso no País

Recém-empossado como presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), o empresário Carlos Pastoriza ressalta que o segmento vive um momento difícil. A expectativa é de que o faturamento do setor caia entre 10% a 15% nesse ano frente aos R$ 80 bilhões movimentados em 2013. Para ele, a conjuntura econômica pouco favorável aliada ao chamado Custo Brasil faz com que “as vendas estejam entrando em colapso”. Mesmo assim, o dirigente confia que o quadro pode ser revertido nos próximos anos. Pastoriza veio ontem a Porto Alegre para se reunir com empresários gaúchos do setor de bens de capital mecânicos e representantes locais dos setores metalmecânico e eletroeletrônico.

Jornal do Comércio – Quais são os desafios do setor nestes próximos quatro anos?

Carlos Pastoriza – Temos anos muito desafiadores pela frente. Nesta equação macroeconômica que o País se encontra hoje, a indústria de transformação está na ponta perdedora. Ao contrário de outros setores, nossos produtos são facilmente importáveis e exportáveis, então você não tem uma barreira natural como o setor de serviços ou a construção civil possuem. Você não consegue importar apartamento da China, mas pode trazer uma máquina de onde você quiser. A isso se soma o fato de que somos, por definição, uma indústria de cadeia longa. Até se chegar à máquina, por exemplo, passa-se por sete ou oito estágios de transformação. O minério de ferro vira barra, que vira chapa, que depois dobra e vira uma peça, que depois vira um conjunto e aí se torna uma máquina. Em cada um desses estágios, o Custo Brasil incide. Então, somos muito mais afetados por tributos, câmbio ruim e juros altos. É necessário fazer um ataque sem trégua a todos esses componentes do chamado Custo Brasil.

JC – Esse é um dos momentos mais difíceis para o setor?

Pastoriza – Estamos vivendo um dos momentos mais delicados em, pelo menos, 20 anos. Jamais houve uma conjugação tão nefasta de fatores, como o câmbio subvalorizado, que encarece os nossos custos e barateia a importação. Hoje em dia, qualquer industrial se tiver a ideia de buscar a melhor tecnologia do mundo, vai colocar na planilha os custos e verá que terá um custo 30% mais caro do que na Europa. Isso, principalmente por causa do câmbio

JC – Mesmo o câmbio consolidado em um patamar acima de R$ 2,00 nos últimos dois anos não trouxe melhoras para o setor na exportação?

Pastoriza – Olha, é que lá atrás estava pior ainda. O cálculo que fazemos é outro. Basta você voltar a 2001, na época do Fernando Henrique (Cardoso) na presidência, que era quando tínhamos um saldo positivo na balança comercial (da indústria). Naquela época, o câmbio era igual ao de hoje, em torno de R$ 2,30 cada dólar. Nesses 13 anos, o câmbio subiu e desceu, mas agora está no mesmo patamar de antes. Só que a inflação aumentou quase 100%. Isso significa que os custos aumentaram significativamente. E não há choque de inovação que compense. A nossa defasagem é brutal. Não há como um país como o nosso aumentar o PIB per capita sem que haja industrialização. Não vai ser exportando minério de ferro ou soja que vamos enriquecer. Não tenho nada contra a exportação de commodities. Os Estados Unidos exportam muitas commodities, mas são uma potência industrial. Nós, com juros altos que atraem capital especulativo e mantêm o câmbio desfavorável, estamos matando a indústria de transformação. O pessoal da indústria extrativa está bem e tira de letra o Custo Brasil, pois os preços das commodities explodiram em dólar. E a construção civil também não vai mal, pois eles têm uma proteção natural, já que ninguém vai importar casa da China. Aí eles jogam o Custo Brasil nos preços dos imóveis. Já a indústria de transformação está sendo destroçada. Se isso não for revertido rapidamente, vamos condenar o Brasil a ser um país colônia e não uma potência, pois só vai exportar commodities e importar tudo que for transformado.

JC – De que forma a própria indústria de transformação pode agir para reverter isso?

Pastoriza – As empresas precisam fazer a sua revolução interna. Um programa de modernização do parque fabril brasileiro é fundamental. O maquinário das indústrias brasileiras tem uma idade média de 17 anos, o que é horrorosamente velho. Na Alemanha, a média do parque fabril é de seis anos. Os alemães estão trabalhando de uma forma muito mais automatizada e veloz que os brasileiros. Por isso, a competitividade do trabalhador alemão é quatro vezes maior que a do brasileiro. Cerca de 60% da produtividade de uma fábrica tem a ver com a modernidade dos equipamentos disponíveis ao
trabalhador.

JC – Qual seria o investimento necessário para indústria modernizar seu maquinário?

Pastoriza – Em termos de custo de reposição de maquinário em todo o parque fabril brasileiro vale R$ 1,6 trilhão, sendo que 30% disso tem mais de 20 anos de idade. São equipamentos obsoletos. Já conversamos com a presidente Dilma Rousseff e a nossa proposta é de que se faça um programa com oito anos de duração chamado Modermaq, para substituir esse maquinário ultrapassado. Seriam necessários investir R$ 560 bilhões para substituir esses 30%. Nós queremos um programa no qual quem tem equipamento velho faça o descarte em um centro homologado pelo governo. Depois a empresa iria ao fabricante de máquinas e o governo daria crédito fiscal (para abater de impostos federais) equivalente a 15% do valor do equipamento novo. Além disso, pedimos uma linha de financiamento mais agressiva que o PSI-Finame. Se o governo fizer essa iniciativa estimamos que, em oito anos, metade dos equipamentos com mais de 20 anos serão trocados, totalizando R$ 280 bilhões em troca de maquinário no período. Isso daria um choque de produtividade, que impactaria em, pelo menos, 1 ponto percentual a mais no PIB do País por ano. Já soubemos que o governo está preparando um programa semelhante a esse, que está sendo finalizado.

JC – Mesmo com a conjuntura delicada, o empresário industrial iria investir em maquinário nesse momento?

Pastoriza – Tem razão. Nenhum empresário compra equipamento porque está barato, ele tem que enxergar esse ganho de produtividade. Acreditamos que, no começo, a participação seria mais tímida. A adesão a esse programa vai aumentar conforme o Brasil faça seu dever de casa e o PIB cresça. Com o PIB crescendo e o Custo Brasil baixando, o empresário vai estar incentivado a trocar o equipamento velho pelo novo.
 
Jornal do Comércio – 19/8/2014 - Fernando Soares
 

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